Mundo Pessoa

A família é uma forma de sequestro; e o sequestro desenvolve sonhos eróticos e de glória, devoções extáticas e rasgos patrióticos em geral susceptíveis de discordar do sólido julgamento das pessoas.

Agustina Bessa-Luís, Eugénia e Silvina, Guimarães, p. 11.

Agora, o que se diz da Sibila surpreende-me bastante. Dividem-na em porções, como os mapas de campanha, e descobrem nela teoremas de Lacan e de Freud. Eu sempre pensei que A Sibila era a minha tia Amélia, vaidosa e com jeito para coisas de tribunais, e que sabia como ninguém estufar um pato com pimenta, num lume de rama de pinheiro. A resina, ao arder, dava ao pato um sabor especial. Entre isso e Lacan não sei que relação haverá.

Agustina Bessa-Luís, Contemplação Carinhosa da Angústia, p. 155.

Sentir-se culpado é um dos atractivos da delinquência.

Agustina Bessa-Luís, Prazer e Glória, Guimarães, p. 52.

O talento serve para iludir o crime.

Agustina Bessa-Luís, Prazer e Glória, Guimarães, p. 55.

Os artistas não têm sentimentos; têm uma forma de os honrar pela definição e até pelo abuso das suas invenções, que os tornam mais duradouros do que são.

Agustina Bessa-Luís, Prazer e Glória, Guimarães, p. 17.

Inventar é uma forma de perceber.

Agustina Bessa-Luís, A Ronda da Noite, Guimarães, p. 211.

Não é à loucura que se deve o génio, mas às condições da lucidez.

Agustina Bessa-Luís, O Princípio da Incerteza III –  Os Espaços em Branco, Guimarães, p. 300.

Francamente – porque pensam eu eu escrevo? Para incomodar o maior número de pessoas com o máximo de inteligência. Por narcisismo, que é um facto civilizador. Para ganhar a vida e figurar no Larousse com  o mesmo realismo utópico aplicado a Madame de Pompadour. Que, sendo pequenina e abonecada, ali se apresenta como «grande, bien-faite». A fama de uma pessoa confunde o juízo, como o amor fabuloso e o erotismo pedante.

Escrevo para desiludir com mérito, que é a maneira de se fazer lembrar com virtude.

Agustina Bessa-Luís, Contemplação Carinhosa da Angústia, Guimarães, p. 15. 

Toda a qualidade criativa duma pessoa depende da sua energia em abandonar a cumplicidade com os demais, o que equivale a sacrificar uma parte honesta do seu próprio ser e que corresponde à paz com o mundo.

Agustina Bessa-Luís, As Relações Humanas I – Os Quatro Rios, Guimarães,  pp. 83/84. 

O mundo das artes e da informação estava dividido entre desconhecidos e era inútil dizer coisas belas, que ninguém ouvia excepto se tivesse um curriculum a acompanhá-las. As ideias circulavam como um cachimbo de paz, ninguém aprendia nada senão que era preciso ganhar mais e ter uma segunda casa e um carro com extras.

Agustina Bessa-Luís, O Concerto dos Flamengos, Guimarães, p. 162.